Um ambiente de juros mais altos por mais tempo é particularmente inóspito para ativos alternativos. Seu valor presente líquido é menor por conta do fator de desconto maior, sendo esse precisamente o efeito riqueza negativo que é um dos resultados de uma política monetária mais apertada, a qual visa desacelerar a absorção doméstica de bens e serviços para baixar a inflação.
Não surpreende que o desempenho do índice global S&P de Real Estate Investment Trusts (REITs) venha sendo pífio, tanto no acumulado do ano quanto nos últimos três anos (Gráfico I). Outra popular classe de ativo, private equity, também enfrenta tempos difíceis. Segundo pesquisa recente, expansão de múltiplos e alavancagem financeira geraram quase dois terços do retorno de transações buyout entre 2010 e 2021.1 Porque houve pouquíssima geração efetiva de valor por tantos anos, um maior custo de capital está agora cobrando pesado tributo sobre essa indústria, levando à contração de múltiplos e desalavancagem.
Porém um outro tipo de ativo alternativo exibe taxas positivas de retorno de preços, tanto no curto como no médio prazo: commodities. Como entender isso? Para começar, alavancagem financeira, taxas de capitalização (lucro operacional líquido do ativo dividido pelo seu valor de mercado atual ou preço de venda), relação dívida/LAJIDA (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização), e fatores similares que agora destroem valor de outros ativos têm papel menor em produtos primários frente a considerações simples de oferta e demanda. No ápice da globalização, variações na demanda (tipicamente oriundas de flutuações no crescimento econômico) ditavam mudanças de preços de commodities, pois a produção ocorria em regiões com melhor custo-benefício e a oferta era dada.
Desde a Crise Financeira Global (CFG) e o início da globalização fraturada, a dinâmica mudou. Uma geopolítica pior, junto com investimento insuficiente e cadeias mundiais de valor menos eficientes geraram gargalos de oferta que possibilitam altas de preços de commodities mesmo com menor crescimento do PIB. Decerto há alguns exemplos extremos. Em 2010 metais preciosos romperam com o padrão de produtos primários e ficaram exorbitantemente caros (Gráfico II). Nesse caso, erros de política econômica em economias avançadas, os quais levaram à persistência inflacionária, parecem ser outro importante fator por detrás da trajetória exuberante. Aparentemente induziram uma grande porção de investidores a migrar de instrumentos financeiros tradicionais para ouro, platina e prata, de modo a proteger o valor real de seus portfólios.
Após um “vale” de curto prazo em 2016, efeito do taper tantrum nos EUA (forte alta no retorno esperado dos títulos do Tesouro como resultado do anúncio do Federal Reserve de que em breve iniciaria a redução de sua política de compra de ativos em mercado que assegurava nível satisfatório de liquidez), os preços de metais preciosos subiram 74%. A taxa composta de crescimento anual (TCCA) implícita no período é de 7,4%. Não menos impressionantes são os percentuais descontados da inflação: 33% e 3,7%, respectivamente. Por conseguinte, a exposição a esse tipo de commodity pagou-se generosamente.
Um segundo grupo de commodities, energia, teve seus preços elevados de forma mais espetacular. Os respectivos percentuais nominais desde 2016 são 126% (variação acumulada) e 11,1% (TCCA). Descontada a inflação, as percentagens são 73% e 7.3%, respectivamente, e vale lembrar que nesse meio tempo houve abrupta, ainda que breve, queda devido ao choque da pandemia em 2020-21. Não é intuitivo, mas é uma história de custos mais altos de combustíveis fósseis, efeito de despesas de capital subótimas no lado da oferta e da deterioração geopolítica. Ocorre que a matriz energética primária mundial ainda se apoia pesadamente em petróleo, carvão e gás natural, que respondiam por não menos que 77% do total em 2022, a mesma parcela de 2000 (Gráfico III). Hidro, eólica, solar e outras fontes de geração de baixo carbono avançaram sobre energia nuclear e biomassa tradicional (lenha e resíduos animais ou agrícolas). Tal resultado surpreendente resulta de fenômenos peculiares em economias-chave. Enquanto a Rússia, por razões estratégicas, mal tocou em seu mix energético (combustíveis fósseis perfaziam 88% do uso per capita de energia na virada do milênio e 86% 22 anos mais tarde), o Japão se tornou menos “verde” (a cota de carvão, petróleo e derivados subiu de 81% para 85%).
Já o script de commodities não-energéticas - matérias-primas (madeira, algodão, borracha, etc.), alimentos, bebidas e metais & minerais - é menos vibrante. Decerto tem havido gradativa recuperação de preços desde 2016 e o impacto adverso do COVID-19 foi bem menor, mas as oscilações são relativamente modestas. Os respectivos percentuais nominas são 44% (acumulado) e 4,8% (TCCA). Descontada a inflação, eles são 10% e 1,2%, respectivamente. Nesse contexto, um fator-chave tem sido, de novo, investimento subótimo nos últimos anos. Contudo, mudança climática, na medida que implica choques adversos mais frequentes e maiores, juntamente com normas ambientais mais restritivas também estão minando o crescimento da produção em diversas geografias.
Isso posto, é instrutivo desenvolver modelos analíticos mais abrangentes para detectar hiatos de oferta em situações em que a demanda global não está crescendo com vigor, pode estar andando de lado ou mesmo caindo. No caso do agronegócio, por exemplo, tais exercícios revelam que o setor tem pronunciados ciclos de curto prazo (Gráfico IV). Durante a crise pandêmica e na recuperação que se seguiu, um hiato líquido de oferta - situação em que a produção fica aquém do consumo - emergiu, catapultando os preços de forma inédita neste século. Após as graves perturbações de 2020-22, ocorreu correção de mercado em 2023. Uma deflação de 9.4% deu-se por conta de aumento da produção, mas esse ajuste benigno parece estar terminando pois os preços voltaram a subir: +6,9% no ano até abril. E não é uma singularidade, eis que outras commodities também se encarecem. As respectivas taxas para minerais & metais industriais, energia e metais preciosos são 8%, 10% e 15%, a despeito de juros mais altos por mais tempo. Não são boas notícias para banqueiros centrais.
1 McKinsey & Company (2024). Private markets: A slower era. McKinsey Global Private Markets Review. (março) pp 26.
NOTA IMPORTANTE - Este relatório visa apenas informar e não constitui aconselhamento financeiro, jurídico, contábil, tributário ou recomendação de investimento, nem tampouco oferta de venda de instrumento financeiro ou de valores mobiliários. Embora tenham sido tomadas todas as precauções para assegurar que as informações aqui contidas não sejam falsas ou enganosas, o Pátria Investimentos não se responsabiliza pela exatidão, veracidade ou abrangência destas. As informações aqui exibidas são confidenciais e para uso exclusivo dos cotistas de fundos administrados pelo Pátria, não podendo ser divulgadas ou distribuídas, no todo ou em parte, para terceiros, salvo com o consentimento prévio e por escrito do Pátria. Projeções e/ou valores futuros de investimentos não realizados dependem de eventos futuros, que poderão divergir muito de premissas e condições aqui consideradas. Os investidores não devem se basear em informações aqui apresentadas sem buscar, para cada caso, aconselhamento profissional especializado e fundamentado para suas respectivas situações financeiras e seus objetivos de investimento.